Eu deveria estar escrevendo essas linhas diretamente da praia de Da Nang, no Vietnã, mas me encontro em Ao Nang, cidade também praiana e com grafia similar, localizada na vizinha Tailândia. A pandemia do covid-19 ferrou meus planos.
Quer dizer, isso foi o que pensei quando recebi por e-mail a confirmação da Vietjet de que meu voo para o Vietnã, comprado com meses de antecedência, havia sido cancelado por conta do fechamento das fronteiras.
No plano original, pensado em um mundo que não existe mais, neste exato momento eu deveria estar imerso na cultura local do Vietnã, talvez comendo um bánh mì no café da manhã, coletando histórias para o livro de crônicas que estou (estava) escrevendo. De lá seguiria para o Cambodia e depois Indonésia.
A ideia era juntar as novas histórias asiáticas com as que escrevi no último ano durante o período que vivi entre Europa e Brasil. Mas, a vida não estava nem aí para o meu planejamento.
Os 3 C’s: não Causei, não posso Controlar e não posso Curar
Cheguei na Tailândia em 04 de março. Dia 26 do mesmo mês o governo do país decretou estado de emergência. Passei os últimos dias de março, o mês inteiro de abril e a primeira semana de maio trancado num apartamento minúsculo em Chiang Mai, cidade ao norte do país.
O fim do meu aluguel coincidiu com o fim do lockdown e consegui me mudar para uma praia no sul, onde estou morando ainda sem saber quando poderei sair da Tailândia –– e antes que alguém pergunte: não, não quero e não estou tentando voltar para o Brasil.
Com as fronteiras fechadas e sem turistas, os preços das moradias despencaram por aqui e consegui alugar uma casa que, até então, estaria bem longe do meu padrão de vida –– pela primeira vez na vida tenho uma piscina e pela metade do preço! (Ó a oportunidade aí! 🤯)
A mudança de ares foi fundamental para a minha produtividade. O mês anterior foi, provavelmente, o mais improdutivo da minha vida profissional nos últimos tempos. Enquanto muitos faziam lives no Instagram, criavam cursos online ou escreviam no LinkedIn que “toda crise é uma oportunidade”, eu passava meus dias afundado na cama acompanhando notícias sobre o covid-19 e assistindo filmes para passar o tempo.
Um desses filmes que assisti foi o belíssimo Beautiful Boy (2018), que acompanha a conturbada jornada de David Sheff (Steve Carell), um pai tentando ajudar seu filho, e Nic (Timothée Chalamet), que está se afundando no vício em metanfetamina. A trama, que é uma adaptação de um livro de memórias escrito pelo próprio David, acompanha a luta dessa família para se recuperar ao longo dos anos.
Um dos pontos altos de Beautiful Boy, na minha opinião, é quando o personagem de Steve Carell, ao perder as esperanças de tentar ajudar o filho, procura um grupo de apoio para pais que têm filhos viciados em drogas.
Embora não haja um diálogo sobre isso, em uma das cenas um cartaz aparece rapidamente descrevendo os “três C’s” dos pais que estão sofrendo com o vício dos filhos:
- I didn’t cause it / eu não causei isso;
- I can’t cure it / eu não posso curar isso;
- I can’t control it / eu não posso controlar isso.
Mesmo que meu contexto seja completamente diferente, os três C’s foram como um clique.
Estava eu ali numa segunda-feira a tarde, afundado numa cama em um país estrangeiro, completamente sem energias por causa de algo que foge do meu domínio. E o pior: sendo eu uma pessoa privilegiada que pode trabalhar remotamente.
Insira aqui a sua frase motivacional favorita (a minha é: ‘se a vida te der um limão, faça uma limonada!’)
Eu detesto frases motivacionais porque elas não levam em conta o contexto individual das pessoas. Tudo que contei aqui foi do alto do privilégio de alguém que continuou trabalhando normalmente de forma remota em meio ao caos –– e agora está fazendo isso isolado em uma praia paradisíaca na Tailândia.
Muita gente perdeu o emprego, muitas empresas perderam clientes e, principalmente, muitas pessoas estão ferradas mentalmente –– sem conseguir produzir, sem conseguir se concentrar no trabalho.
Se você está dentro desse último contexto e ainda tem um trabalho e condições financeiras para se manter durante os próximos meses, talvez o que eu escreva abaixo te dê uma luz. Talvez você consiga se apegar aos três C’s.
Eu também estava ferrado mentalmente por causa da pandemia. Não conseguia focar nas minhas coisas. Passava os dias absorvendo notícias que só me faziam mal. Até que, utilizando um termo que também detesto, mudei meu mindset e me toquei que não causei, não posso controlar e não posso curar o covid-19. Eu posso e devo seguir trabalhando.
Ou seja, enquanto ficava afundado na cama pensando em quando poderei viajar novamente ou esperando o momento certo para lançar o novo livro, a vida estava seguindo seu fluxo. E a vida, hoje, não é mais como a conhecíamos. Tem um vírus lá fora que só vai sumir quando tivermos uma vacina –– que não será criada por mim; nem por você, imagino.
Sabe aquele papo do limão e da limonada?
O projeto do livro de crônicas não faz mais sentido no momento, mas comecei a escrever um outro livro. Também escrevi um conto para o Prêmio Contos da Quarentena, da Livraria Lello, lancei um projeto literário com o Murillo Leal (que também deve virar livro) e, com a ajuda do Marcos Korody, da person.agency, estou investindo pela primeira vez em anúncios para vender meus cursos online –– em menos de 1 mês triplicamos as vendas.
Meu ponto com isso tudo é que é ok você não se sentir produtivo durante a quarentena, eu mesmo passei por isso, mas não sabemos até quando este novo normal será o novo normal. A pandemia pode durar anos. Não sabemos.
Uma hora temos que nos mexer. Uma hora temos que tirar nossos projetos do papel. E se nossos projetos não fizerem mais sentido dentro do novo normal, bora pensar em outros.
Eu demorei pouco mais de 1 mês pra entender isso e cada um tem seu tempo, mas bicho, te aligeira aí. Escreva um livro e publique de forma independente na Amazon, grave um curso, ofereça algum tipo de consultoria ou mentoria online.
As ferramentas do novo normal estão em nossas telas.
Planejamento é ótimo e sou seu grande defensor em todas as áreas da vida, mas o tempo está passando, cara. Muda o tal do mindset aí.