A livraria onde lancei Nômade Digital, meu primeiro livro, não existe mais. Fechou as portas devido à crise no mercado editorial e deu lugar a uma franquia de fast fashion. Os 7% de direitos autorais que recebo semestralmente pela obra, que vendeu relativamente bem e foi finalista do Prêmio Jabuti, mal pagam 1 mês de aluguel numa kitnet em São Paulo. Dia desses me perguntaram no Instagram porque decidi ser escritor. Me pego fazendo o mesmo questionamento vez ou outra.
O renomado escritor e quadrinista Lourenço Mutarelli disse em entrevista para o G1 que nem de longe conseguiria viver do seu trabalho autoral. “No início, durante quase uma década, fui bancado pela minha esposa. Atualmente, vivo oito meses do ano de oficinas que dou no Sesc Pompeia. Nos demais meses, me viro como consigo. Brinco que, nesses meses, faço mágica“. Assim como o autor do genial O cheiro do ralo, são meus cursos que pagam as contas desde que desisti de deixar o plugin de SEO do WordPress verdinho nos freelas que fazia como redator de marketing de conteúdo – este texto, inclusive, não seguirá as boas práticas de SEO e descansará em paz nas últimas páginas de pesquisa do Google.
Charles Bukowski só ficou famoso com a sua escrita – e pôde pagar suas contas com ela – após os 50. Antes disso, fez de tudo um pouco para se virar. Trabalhou em uma fábrica de biscoitos para cachorro, entregou panfletos no metrô e foi carteiro por 12 anos – experiência que inspirou seu primeiro romance, Cartas na rua.
O epitáfio da lápide do ex-carteiro que se tornou um dos maiores escritores de sua geração diz “não tente”. Em seu poema Jogue o dado, o velho Buk escreve “Se você vai tentar, vá com tudo / Senão, nem comece”. Essa era a sua filosofia. Ir com tudo; superar desafios; abrir mão de uma ou outra coisa; insistir. “Não tente” e “se você vai tentar”, não são ideias opostas, mas complementares. “Vá com tudo” é a resposta para “não tente”. Bukowski foi com tudo e explicou, em outro poema, que reproduzo abaixo na íntegra, porque não desistiu no meio do caminho.
Então você quer ser escritor?, por Charles Bukowski.
se não irrompe de dentro de você
apesar de tudo,
não faça.
a menos que venha sem pedir do seu
coração e da sua mente e da sua boca
e das suas entranhas,
não faça.
se você tem que se sentar por horas
encarando a tela do computador
ou debruçado em sua máquina de escrever
procurando palavras,
não faça.
se você estiver fazendo isso por dinheiro ou
fama,
não faça.
se estiver fazendo isso porque quer
mulheres em sua cama,
não faça.
se você tem que sentar lá e
reescrever de novo e de novo,
não faça.
se é cansativo apenas pensar em fazer isso,
não faça.
se estiver tentando escrever como outra
pessoa,
esqueça.
se você tem que esperar isso rugir de dentro de
você,
então espere pacientemente.
se isso nunca rugir de dentro de você,
faça alguma outra coisa.
se você primeiro tem que lê-lo para sua esposa
ou sua namorada ou seu namorado
ou seus pais ou para ninguém,
você não está preparado.
não seja como tantos escritores,
não seja como tantos milhares de
pessoas que se consideram escritoras,
não seja lento e entediante e
pretensioso, não se consuma com amor-
-próprio.
as livrarias do mundo têm
bocejado até dormir
sobre seu tipo.
não faça parte disso.
não faça.
a menos que isso venha de dentro
da sua alma como um foguete
a menos que manter isso
te leve a loucura ou
suicídio ou assassinato,
não faça.
a menos que o sol dentro de você esteja
queimando suas entranhas,
não faça.
quando for a hora,
e se você tiver sido escolhido,
isso será feito
sozinho e isso continuará se fazendo
a menos que você morra ou isso morra em você.
não há outra maneira.
nem nunca houve.
Naqueles momentos em que me questiono sobre o porquê de continuar escrevendo num cenário cada vez mais desanimador para quem escreve, lembro do velho Buk, lembro também do viajante Kerouac, que escreveu em On the Road que “(…)para mim, pessoas mesmo são os loucos, os que estão loucos para viver, loucos para falar, loucos para serem salvos, que querem tudo ao mesmo tempo, aqueles que nunca bocejam e jamais dizem coisas comuns, mas queimam, queimam, queimam como fabulosos fogos de artifício,(…)”.
A escrita segue queimando aqui dentro e, enquanto a chamar estiver acesa, irei com tudo.
Quer tentar?
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