Polignano a Mare é uma cidadezinha medieval banhada pelo mar Adriático em Puglia, sul da Itália, onde nasceu Domenico Modugno, um dos maiores cantores italianos da história, famoso mundialmente por sua canção Nel blu dipinto di blu (que talvez você conheça como Volare).
Eu estava na cidade natal de Modugno vivendo la dolce vita durante o verão europeu de 2018 quando o nome do chef, escritor, apresentador, viajante e storyteller Anthony Bourdain virou o assunto mais falado no antigo Twitter em 08 de junho daquele ano. Ele foi encontrado sem vida num quarto de hotel na vizinha França. O nova-iorquino estava no país gravando um episódio de Parts Unknown, seu programa na CNN onde mostrava a cultural local de diversos países através da culinária.
Até então programas de TV gastronômicos nunca haviam feito a minha cabeça e confesso ao leitor que naquela tarde em Polignano a Mare eu não fazia ideia de quem era Bourdain. Movido por uma curiosidade mórbida, no entanto, joguei seu nome no Google. Ainda bem.
Desde então sempre que viajo para um novo país pesquiso se Bourdain esteve por lá. Gosto de ouvir suas impressões sobre a cultura local e, claro, suas dicas gastronômicas. Não fosse por ele eu provavelmente teria cometido pela segunda vez o erro de não provar a comida de rua tailandesa de Chiang Mai por medo de passar mal. Não passei.
Curiosidades e dicas à parte, a verdade é que nenhum livro técnico sobre storytelling me ensinou tanto sobre a arte de contar histórias do que as viagens documentadas por aquele que foi o rockstar da gastronomia. Bourdain tinha um jeito único de se conectar com as pessoas.
O que o fazia diferente? Vou tentar explicar neste texto. Continue lendo.
Anthony Bourdain era um ótimo ouvinte
Um bom contador de histórias é, antes de tudo, um ótimo ouvinte. E Bourdain fazia isso com maestria. Ele tinha uma curiosidade genuína, quase infantil.
Com perguntas simples, mas certeiras, Bourdain conseguia extrair o melhor de seus entrevistados. Era como se aqueles desconhecidos com quem conversava fossem velhos amigos.
Estivesse ele comendo um pad thai na Tailândia ou um spaghetti à carbonara na Itália, seu foco estava em ouvir mais do que falar. No final das contas, os episódios dos programas de TV que apresentou não eram necessariamente sobre comida; eram sobre pessoas. Por isso seus telespectadores se sentiam tão conectados.
Anthony Bourdain era autêntico
O cara era autêntico antes disso se tornar estratégia de marketing. Pesquise no Google dicas para melhorar seu storytelling e certamente encontrará algo como “seja autêntico”. O ponto é: não dá pra fingir autenticidade.
Autenticidade significa ser você mesmo. Quando falamos de autenticidade no contexto do storytelling, significa contar as histórias do seu jeito.
No segundo episódio da sexta temporada de Parts Unknown, Bourdain e sua equipe viajam para a Sicília. Em um mundo onde programas de TV e instagrammers capturam apenas os momentos perfeitos das viagens, o ponto alto do episódio foi quando ele desmascarou um pescador local que tentou lhe enganar durante um mergulho jogando do barco polvos congelados enquanto o apresentador mergulhava – para que ele capturasse boas imagens para o programa.
Bourdain narrou o episódio inusitado de forma hilária, do seu jeito único, naquele que se tornou um dos momentos mais marcantes da série da CNN.
“Viagens não são sempre bonitas. Não são sempre confortáveis. Algumas vezes dói, pode até doer o coração. Mas está tudo bem. A jornada te muda; ela deveria te mudar. Ela deixa marcas na sua memória, na sua consciência, no seu coração e no seu corpo. Você leva algo com você. Com sorte, você deixa algo para trás.” (Anthony Bourdain)
Nem toda história ou experiência será sempre perfeita. Se você deseja ser autêntico com o seu conteúdo, fale sempre a verdade, doa a quem doer. As pessoas adoram o lado B das coisas. Seu público o respeitará por isso.
Anthony Bourdain assumia os riscos
Muito antes de se tornar uma personalidade da TV, Bourdain trabalhava mais de 60 horas semanais como chef em Nova York. Ao refletir sobre um empreendimento culinário recém-fracassado, enviou um artigo para o The New Yorker que impulsionou sua carreira como escritor.
No texto, intitulado Não coma antes de ler isso, Bourdain dispara sua metralhadora de palavras contando os bastidores sórdidos do universo dos restaurantes.
Ler um chef falando sobre cabelos na comida, contaminação cruzada de carnes e cozinheiros suados pode ser uma experiência nauseante. Bourdain sabia que estava correndo um risco apontando as falhas de sua indústria (e suas próprias falhas), mas enviou o artigo para publicação assim mesmo.
O risco valeu a pena: o texto deu origem ao best-seller Cozinha Confidencial e impulsionou sua carreira de escritor.
Anthony Bourdain mostrava suas vulnerabilidades
Dez anos após o sucesso de Cozinha Confidencial e já sendo reconhecido como uma personalidade da TV, Bourdain publicou o livro Ao Ponto – minha obra favorita do cara.
Os textos reunidos em Ao Ponto vão muito além das dicas gastronômicas. Bourdain examina a indústria de fast-food americana, revela os bastidores do reality-show Top Chef, fala sobre seu passado com as drogas e encara a paternidade.
Assim como no episódio com o pescador da Sicília, ele deixa de lado a perfeição da TV e do Instagram através de reflexões que expõem suas vulnerabilidades. Bourdain era gente como a gente.
“Parece que quanto mais lugares eu vejo e experimento, mais eu percebo como o mundo é grande. Quanto mais eu conheço, mais eu percebo o quão pouco eu sei das coisas, quantos lugares eu ainda tenho para visitar, quanto ainda há para aprender. Talvez isso seja esclarecimento o suficiente; saber que não há um lugar de descanso final da mente, nenhuma clareza presunçosa. Talvez a sabedoria seja perceber o quão pequeno e sem sabedoria eu sou e o quão longe eu ainda tenho que ir”. (Anthony Bourdain)
O legado de Anthony Bourdain
Bourdain me ensinou que, para ser um ótimo contador de histórias, é essencial ser curioso.
Nós, escritores, costumamos escrever porque achamos que temos algo a dizer. Talvez porque a gente sinta uma vontade incontrolável de compartilhar com o mundo o que vemos. Talvez porque precisamos colocar nossos pensamentos pra fora.
Porém, no final das contas, escrever não é sobre o escritor. Uma história é um momento na linha do tempo que é puro, cru e real, que surgiu não das nossas vontades, mas da nossa curiosidade.
Foi isso que aprendi com Anthony Bourdain.
“Volare oh, oh
Cantare oh, oh”
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