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Em toda livraria que entro, em qualquer lugar do mundo, do mais badalado ao mais remoto, há um livro do escritor brasileiro Paulo Coelho nas prateleiras.

Eu sempre tive um certo preconceito contra o “mago”. Quando perguntado sobre seus livros, fazia comentários sarcásticos, cheios de veneno, como se eu fosse alguém superior por não ler suas obras.

E sabem o que é pior? Eu nunca li um dos seus livros. Me peguei pensando nisso na última semana numa livraria em Portugal enquanto folheava “Hippie“, sua obra mais recente.

Por que diabos o sucesso do Paulo Coelho sempre me incomodou?

Simples. Porque eu queria que fosse o meu nome naquelas prateleiras, nos prêmios que ele ganhou ou mesmo em sua cadeira na Academia Brasileira de Letras. Minhas frustrações foram as responsáveis por eu criar essa aversão. Um preconceito, no sentido mais literal da palavra, sobre o trabalho de alguém que desconheço totalmente. Meu julgamento até hoje foi motivado por conta de uma possível inveja pelo seu sucesso, não pelos seus escritos.

Desde esse fato recente em Portugal, tenho refletido sobre tudo o que “odiei” nesses meus 29 anos de vida. Vejo que muito do meu preconceito com qualquer coisa está ligado às minhas frustrações – muitas delas adolescentes.

O desafio agora, como adulto, é mudar o mindset de adolescente frustrado e me policiar cada vez que um comentário maldoso surgir em minha mente.

Com o Paulo Coelho o primeiro passo foi dado: ontem comprei “O Alquimista“, o livro brasileiro mais vendido da história.

Ainda não o li, mas hoje meu sentimento em relação ao escritor é de admiração. O fato de ele, brasileiro, estar nas prateleiras de vários países ao redor do mundo não me causa mais repulsa. Pelo contrário, me inspira a tentar o mesmo.

Paulo Coelho
Foto: REUTERS/Eloy Alonso.

Valorizando o trabalho de alguém independente dos seus gostos pessoais

Meu preconceito com o Paulo Coelho era algo bobo. Julgamento sem conhecimento de causa. Mas, e quando realmente não gostamos de algo, precisamos falar mal daquilo exaustivamente? Qual o problema em reconhecer o sucesso de alguém independente dos seus gostos pessoais?

Minha primeira viagem para fora da América do Sul foi em 2013. Durante um mochilão pela Europa, ao chegar num restaurante em Praga, na bela capital da República Tcheca, fui recepcionado ao som da mundialmente conhecida “Ai, se eu te pego” do músico Michel Teló.

Para não desagradar o simpático garçom, fingi não odiar o músico. Sim, odiar. Era o sentimento da época. Ao contar a história para meus amigos na volta para casa, desdenhava de como uma música tão ruim pode fazer tanto sucesso. Ruim na minha opinião, claro. A verdade é que muita gente, muita mesmo, ao redor do mundo gosta da canção. Por que, então, eu deveria destilar meu ódio contra o Michel Teló? Por que não ficar feliz com o sucesso mundial de um músico brasileiro? A mente humana nos prega essas peças. Talvez fosse uma velha frustração adolescente, afinal, música é uma das minhas paixões. Eu adoraria que uma música minha (não que eu saiba fazê-las) virasse um hit mundial.

Nas minhas últimas viagens ouvi muito em bares e restaurantes músicas de duplas sertanejas (teve até tailandês cantando em português) que não conheço e, claro, da cantora Anitta. Não curto esse tipo de música, mas hoje, com outra cabeça, fico feliz por esses músicos brasileiros conseguirem romper fronteiras.

O sucesso incomoda até quando você gosta daquilo que faz sucesso. Ficou confuso?

Os californianos do blink-182 foram minha banda favorita da adolescência. Eu era aquele fã nerd que sabia tudo sobre os caras. Em 2004, para a minha surpresa, uma música deles, “I Miss You“, entrou na trilha sonora de Malhação. Bem diferente do pop punk feito pelo trio até então, essa música é uma baladinha, o que fez com que a banda se tornasse muito conhecida no Brasil.

E aí, muito antes desse negócio de raiz x Nutella, começou uma verdadeira guerra no Orkut entre os fãs de blink-182 pré e pós-Malhação. Me tornei um hater de qualquer adolescente que tenha conhecido a banda depois de mim.

Isso, claro, não faz o menor sentido. Como fã da banda, eu deveria ficar feliz que o sucesso deles tenha alcançado cada vez mais gente. Porém, no papel de fã, ainda mais adolescente, temos esse papel de pertencimento. Não queremos que outras pessoas que não estavam ali no começo “entrem pra galera”. É como se essas descobertas underground nos tornassem parte de um clubinho. Quando o clubinho se torna público, perdemos essa identidade.

Já adulto, vi isso acontecer com minha nova banda favorita, os ingleses dos Arctic Monkeys. Os acompanho desde o primeiro álbum, lançado em 2006. Como minha diferença de idade pros caras da banda é de apenas quatro anos, fui evoluindo junto com eles. Até que em 2013 eles explodiram mundialmente com “AM“, seu quinto álbum. Neste caso, porém, fiquei feliz pra caramba em ver suas músicas cantadas pelas massas.

No último final de semana, aliás, assisti um show deles no festival português NOS Alive. Entre o público, adolescentes que eram crianças de colo quando o primeiro álbum da banda foi lançado. Os achei Nutella por isso? Fiquei puto? Que nada. Fiquei feliz por compartilhar o mesmo gosto musical com uma geração já tão diferente da minha.

Quando o adolescente frustrado chega no mercado de trabalho

adolescentes-mercado-de-trabalho
Foto: Unsplash.

Invariavelmente, o adolescente chegará ao mercado de trabalho. Os primeiros anos para um adolescente numa empresa são difíceis. Essa noção errada de que o(a) gestor(a) tem um papel de pai ou mãe atrapalha muito o desenvolvimento do jovem adulto. É como se existisse uma obrigação moral por parte da empresa, por exemplo, em promover aquele jovem após seis meses de trabalho – eu fui esse jovem.

E, como as coisas demoram a acontecer, esse jovem se torna rebelde e começa a despejar suas frustrações naqueles que já alcançaram o tão sonhado sucesso profissional.

Você provavelmente já presenciou ou fez um comentário dizendo que fulano(a) só conseguiu tal coisa, uma promoção, talvez, por causa de alguma “facilidade”. Usamos esses comentários maldosos como uma espécie de mecanismo de defesa. É mais fácil conspirar do que simplesmente aceitar o sucesso de alguém.

Cuidado com o seu rastro digital

Quando o LinkedIn anunciou em 2016 uma lista com os brasileiros mais influentes da rede, incluindo meu nome no terceiro lugar, minha vida profissional mudou. Receber essa chancela da própria rede profissional me abriu diversas oportunidades. Como bom profissional de marketing, claro, eu soube aproveitar isso na hora de “me vender” quando me lancei como freelancer.

Porém, todo bônus vem com algum ônus. Senti na pele esse mesmo ódio que eu tinha pelo Paulo Coelho. Guardadas as devidas proporções, claro – de ódio, talento e sucesso.

Comecei a perceber uma pequena parcela de usuários do LinkedIn falando que “Top Voice é isso ou aquilo”. Como ser humano, ler esses comentários de pessoas que não me conhecem machucou um pouco. Como profissional, percebi o porquê de muita gente não ter sucesso – principalmente no LinkedIn.

Quando você usa sua energia para criticar outras pessoas, fazer comentários maldosos ou criar teorias da conspiração para desmerecer o sucesso de alguém, você coloca seu foco no lugar errado. Veja o exemplo da minha relação com o Paulo Coelho. Se meu sonho é ser um escritor reconhecido mundialmente, ficar criticando o cara (ainda mais sem nunca ter lido um livro seu) não me deixará mais perto disso, pelo contrário. Profissionalmente falando, pode ser um suicídio. Comentários públicos do tipo podem me afastar de editoras e criar antipatia no mercado.

Afinal, tudo o que você faz online deixa uma espécie de rastro digital. Eu, por exemplo, nunca faria negócio com alguém que passa o dia só reclamando da vida ou criticando pessoas públicas nas redes sociais. Talvez aquela empresa para qual você enviou seu currículo também nunca te contrate pelo mesmo motivo.

Pense nisso antes de apertar “enter” quando o veneno da frustração escorrer pelos seus dedos.


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Escritor, educador e TEDx Speaker. Autor de "Nômade Digital", livro finalista do Prêmio Jabuti.
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